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Sequelas cardíacas após a recuperação da doença coronavírus em 2019: uma revisão sistemática

LASSANCE, Marcio

RAMADAN, M. S. et al. Cardiac sequelae after coronavirus disease 2019 recovery: a systematic review. Clinical Microbiology and Infection., v. 27, n. 9, p. 1250-1261, Set. 2021 [Epub 23 jun. 2021] DOI: 10.1016/j.cmi.2021.06.015 Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34171458/

Não obstante a infecção pelo vírus SARS-CoV-2 seja responsável pela síndrome respiratória aguda grave, sabe-se que pode desencadear manifestações extrapulmonares, mormente problemas cardiovasculares. Isto pode ocorrer em qualquer momento da infecção pelo vírus, perdurando, por vezes, várias semanas após a recuperação do COVID-19. No presente artigo realiza-se revisão sistemática com foco nas sequelas cardíacas em adultos recuperados da COVID-19.

Acredita-se que os mecanismos pelos quais o vírus pode afetar o coração resultam de ação direta no músculo cardíaco e no endotélio dos vasos que os nutrem, assim como indireta, resultado da “tempestade de citocinas inflamatórias”, hipercoagulabilidade e hipóxia. Há, no entanto, questões acerca da reversibilidade das lesões cardíacas, o que, em última análise, resultaria em sequelas permanentes.

O estudo caracteriza-se por uma revisão sistemática da literatura com estudos extraídos de diversas bases, incluindo pesquisas realizadas de 2019 e 2021. Os desfechos investigados limitaram-se ao período pós-recuperação. Foram colhidas informações relativas a sintomas cardiovasculares referidos (dados subjetivos), assim como alterações estruturais ou funcionais (dados objetivos).

A análise foi realizada com 35 estudos, selecionados de um total de 2.867 estudos, o que englobou 52.609 pacientes com idade entre 19 e 74 anos. Os desfechos objetivos foram avaliados por meios de ressonância magnética nuclear cardíaca, ecocardiograma, eletrocardiograma, exames de sangue (NT-proBNP, Troponina) e cateterismo cardíaco (cineangiocoronariografia e biópsia miocárdica). Em contrapartida, os dados dos desfechos subjetivos foram extraídos de questionários.

Os doze estudos que avaliaram pacientes submetidos à ressonância magnética nuclear mostraram alterações estruturais do coração em todos os pacientes infectados. Variavam desde variações na intensidade do sinal e captação do gadolínio (contraste paramagnético) até envolvimento miocárdico e pericárdico (miocardite e pericardite).

Os estudos que se utilizaram de ecocardiografia para avaliação cardíaca mostraram, entre outras alterações, redução da fração de ejeção (função cardíaca), derrame pericárdico e hipertensão pulmonar em até 16% dos pacientes.

Mudanças vistas no eletrocardiograma ocorreram em até 27% e contemplavam mudanças na onda T, segmento ST, bloqueio do ramo direito e taquicardia sinusal. Enzimas cardíacas aumentadas (Troponina) foram detectadas em até 20% dos casos e os níveis de NT-pro-BNP, marcador de insuficiência cardíaca, aumentaram em até 23% dos pacientes.

Em todos os pacientes submetidos à biópsia miocárdica foi vista inflamação sem, no entanto, a presença de genoma viral. Doença arterial coronariana foi vista em até um quarto dos pacientes que realizaram cineangiocoronariografia.

Com relação aos sintomas cardiovasculares, houve, em vinte estudos, relatos de dor torácica, palpitações e dispneia em até 88% dos pacientes.

Este estudo nos mostra que o acometimento cardiovascular da COVID-19 é frequente e pode deixar sequelas. No entanto, há de se ter cuidado ao se interpretar os dados obtidos: quanto maior a acurácia diagnóstica, mais frequentemente são detectadas alterações estruturais do coração. Vimos que todos os pacientes que realizaram ressonância magnética nuclear tiveram algum grau de anormalidade e isto pode não ser clinicamente relevante. Da mesma forma, os sintomas relatados pelos pacientes podem ter outras causas não cardíacas. Podemos então concluir que, à luz dos estudos analisados, a infecção pelo SARS-CoV-2 podem associar-se a sequelas cardíacas, clínicas ou subclínicas, que incluem miocardite, pericardite, infarto do miocárdio, arritmias e hipertensão pulmonar. Cronologicamente, as sequelas que ocorrem nos primeiros três meses tendem a ser mais graves do que aquelas ocorrendo após este período.

Concluindo: para melhor compreensão do real impacto clínico do acometimento cardiovascular da COVID-19 seriam necessários estudos controlados com desfechos mais definidos.

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