MELO, J. R. R. et al. Adverse drug reactions in patients with COVID-19 in Brazil: analysis of spontaneous notifications of the Brazilian pharmacovigilance system. Cad Saude Publica v. 37, n. 1, p. e00245820, Jan. 2021. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33503163/
As reações adversas a medicamentos são consideradas um grave problema de saúde pública e contribuem para o aumento da morbimortalidade e de gastos para o paciente e para os sistemas de saúde.
Até o momento ainda não foi identificado um tratamento eficaz específico para COVID-19 e vários fármacos são utilizados sem evidências de sua eficácia. Dados preliminares de estudos in vitro identificaram atividade antiviral dos fármacos cloroquina e hidroxicloroquina, associados a antibióticos como azitromicina, e estes foram recomendados em alguns países como terapia medicamentosa contra o SARS-CoV-2. Apesar desses fármacos serem indicados para outras doenças, o uso nesta pandemia é experimental, e mesmo o uso compassivo pode representar riscos à saúde devido ao potencial de causar reações adversas, principalmente o risco de cardiotoxicidade. As reações adversas a medicamentos podem prolongar o tempo da internação do paciente, agravando ainda mais a busca por leitos para novos pacientes infectados.
Este estudo teve como objetivo avaliar as reações adversas identificadas nos pacientes com COVID-19, segundo características de pessoas, medicamentos e reações, bem como identificar os fatores associados ao surgimento de reações graves nestas pessoas.
A metodologia consiste em um estudo transversal, com etapas descritiva-exploratória e analítica, utilizando como fonte de dados os relatórios de segurança de casos individuais encaminhados ao Centro Nacional de Monitorização de Medicamentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A população foi constituída pelos pacientes com COVID-19 que apresentaram reações adversas a medicamentos e foram notificados no Sistema Brasileiro de Farmacovigilância.
Foi considera reação adversa grave qualquer reação que resulte em morte, ameaça à vida, que cause internação hospitalar ou prolongue a internação, resulte em incapacidade, persistente ou significativa, ou que cause anomalia congênita.
A pesquisa descreveu 631 reações adversas a medicamentos em 402 pacientes no período de 01 de março de 2020 a 15 de agosto de 2020.
As reações se manifestaram prioritariamente no sistema cardíaco (38,8%), gastrointestinal (14,4%), tecido cutâneo (12,2%) e hepático (8,9%). As reações mais relatadas foram o prolongamento do intervalo QT no eletrocardiograma (33,6%), diarreia (7,4%), prurido (6,5%) e a elevação das transaminases do fígado (6%).
Os principais medicamentos suspeitos de causar as reações foram hidroxicloroquina (59,5%), azitromicina (9,8%) e cloroquina (5,2%). Homens e idosos acima de 65 anos tiveram maior chance de apresentar reações adversas graves. A cloroquina e a hidroxicloroquina foram os únicos medicamentos associados a reações adversas graves, como o aumento do intervalo de QT acima de 500ms, de forma dose-dependente.
Os autores discutem que as características dos participantes foram semelhantes a outros estudos com esta mesma temática, com a prevalência do sexo masculino, pacientes acima de 60 anos, com doenças concomitantes e em uso de múltiplos fármacos. Também são semelhantes os principais locais de manifestação das reações, que foram o sistema cardíaco, gastrointestinal, cutâneo e hepatobiliar. O prolongamento do intervalo QT informado neste estudo foi maior do que o encontrado em outros estudos. Uma explicação para este achado foi a maior exposição do Brasil à cloroquina e hidroxicloroquina, drogas que tiveram uso interrompido no início da pandemia em outros países.