Wu,Q.; et al. Coinfection and Other Clinical Characteristics of COVID-19 in Children. Pediatrics, v. 146, n. 1, Jul. 2020. DOI: 10.1542/peds.2020-0961. Disponível em: https://pediatrics.aappublications.org/content/early/2020/06/08/peds.2020-0961
Trata-se de um estudo retrospectivo com 74 crianças realizado entre 20 de janeiro e 27 de fevereiro em dois hospitais chineses objetivando determinar características clínicas e epidemiológicas de pacientes pediátricos com COVID-19 além de eventuais comorbidades associadas. Foram coletados dados epidemiológicos detalhados, avaliando se tinha havido contato domiciliar com casos confirmados de adultos (95,6%), sequência de contaminação dentro da família (27,7% foi o 2º caso, 35,4% o terceiro, 21,5% o quarto, 13,9% o quinto e 1,5% o sexto caso) e se a criança infectada havia transmitido o vírus para outras pessoas. A confirmação laboratorial foi feita pela positividade da RT-PCR para SARS-CoV-2 em swab nasofaríngeo.
O diagnóstico foi feito de acordo com os critérios definidos pela Sociedade de Pediatria Chinesa (SPC) em: 1) infecção assintomática (RT-PCR positivo para SARS-CoV-2, sem sinais clínicos, sem alterações radiológicas) [27,0%]; 2) infecção aguda do trato respiratório superior (febre, tosse, dor de garganta, congestão nasal, fadiga, cefaleia e/ou mialgia, sem pneumonia ao Rx, sem septicemia) [34,4%]; 3) pneumonia leve (sem sintomas clínicos ou com poucos sintomas, como febre e tosse, imagem radiológica sugestiva de pneumonia sem severidade) [39,2%]; 4) pneumonia severa (frequência respiratória ≥70 incursões respiratórias por minuto {irpm} em crianças < 1 ano ou ≥ a 50 irpm em crianças ≥ 1 ano, saturação O2 <92%, hipóxia, cianose, alterações de consciência, recusa alimentar e sinais de desidratação) [1,4%] e 5) casos críticos (aqueles que indicaram necessidade de CTI: falência respiratória, choque séptico ou combinação com falência de órgãos) [0%].
A idade média foi 6 anos (1 mês a 15 anos), 59,5% meninos, 32,4% apresentaram tosse e 27,0% febre, os sintomas mais comuns no início da doença; 21,6% apresentaram roncos e crepitações na ausculta pulmonar. Entre os achados laboratoriais 31,1% apresentou alteração da leucometria, 13,5% da contagem de linfócitos, 17,6% aumento da PCR (máximo de 39,0 mg/L) e 35,7% da VHS; 46% das crianças foram triadas para outros patógenos que podem causar infecção respiratória e destas 51,4% apresentaram coinfecção (84,2% por Mycoplasma pneumoniae (MP), 15,8% por vírus sincicial respiratório, 15,8% pelo vírus de Epstein Bar, 15,8% por citomegalovírus e 1% por influenza). A análise de SARS-CoV-2 em amostras fecais foi positiva em 13,5% das crianças e mesmo após a negativação do vírus nas amostras respiratórias o exame permaneceu positivo nos exames fecais até mesmo 4 semanas após o início do quadro. Sabe-se que o RNA do SARS-CoV-2 pode ser detectado nas fezes de pacientes assintomáticos ou com história de diarreia prévia.
As análises estatísticas foram feitas usando SAS software (SAS 9.4; SAS Institute, Inc, Cary, NC).
Quando da admissão, 5,4% realizaram tomografia computadorizada de tórax (TCT) sem anormalidades. Alterações radiológicas foram vistas em 50%, sendo 21,6% no pulmão esquerdo, 35,1% no direito e em 43,2% bilaterais. Nas crianças com alterações na TCT, 81,1% tinham sintomas clínicos. Apenas 12,2% mostraram alterações típicas de COVID-19 na TCT, incluindo imagens em vidro fosco.
Os pacientes foram tratados de acordo com o protocolo da SPC com interferon, inalação, drogas antivirais e medicina tradicional chinesa. As crianças com MP usaram azitromicina oral ou intravenosa.
Cerca de 27,0% eram portadoras assintomáticas de SARS-CoV-2 e 71,6% dos casos considerados leves a moderados apresentaram manifestações diversas.
A mortalidade em adultos é cerca de dez vezes maior. O motivo da doença ser menos grave em crianças permanece a esclarecer, sendo talvez devido ao fato de a imunidade inata responder melhor que a imunidade adquirida.