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Apoio de pares em epidemias e intervenção em crises via mídia social

FAGUNDES, Dorival

CHENG, P. ; et al. COVID-19 Epidemic Peer Support and Crisis Intervention Via Social Media. Community Ment Health J., v.56, n.5, p. 786-792, jul. 2020.  Doi:10.1007/s10597-020-00624-5 Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32378126/

O artigo descreve um projeto de apoio psicológico aos profissionais de saúde atuantes na linha de frente da COVID-19 em Wuhan, China, formulado e efetivado por profissionais experientes em saúde mental. Identificou-se que a pandemia causou grande sofrimento psíquico aos profissionais da linha de frente. Os autores descreveram a infraestrutura da equipe, assim como um novo modelo de apoio mental aos colegas em tempos de crise, utilizando um aplicativo de mídia social (WeChat). Tal modelo de atenção e suporte pode ser implementado em outras localidades.

Resgata-se o histórico da pandemia, com ênfase nos momentos iniciais, quando médicos notaram um novo tipo de pneumonia causado por um patógeno desconhecido. Destaca-se ainda as crises de saúde mental desencadeadas nos profissionais de saúde. Quando Wuhan foi subitamente fechada os seus habitantes entraram em pânico caótico, com milhares de pessoas exigindo cuidados nos hospitais, deixando o sistema local à beira da ruptura e os profissionais da linha de frente enfrentaram esse momento com recursos inadequados. Dado esse contexto, um grupo de profissionais de saúde mental dos EUA, Austrália e Canadá reuniu uma equipe para fornecer apoio psicológico aos trabalhadores de saúde. Reconhecida a urgência do tratamento, foi imediatamente iniciado.

Descrevem o projeto de atendimento aos pares, dividindo a explicação em quatro tópicos: (i) infraestrutura e organização (uso do WeChat, explicitação dos critérios de recrutamento dos profissionais atendidos e especialidade dos membros de apoio); (ii) ambiente de trabalho, diretrizes, plataforma, operação e limites (pontuam a neutralidade política do grupo e apresentam as diretrizes de atuação, dentre as quais “não fazer mal” e garantir confidencialidade); (iii) dinâmica do funcionamento em grupo (dois grupos online: voluntários para discussão do trabalho; profissionais chineses); (iv) operações de serviço (rotina e modus operandi do apoio psicológico oferecido).

Oferecem mais quatro tópicos para discussão: (i) estratégia de saída e encaminhamento (como a intervenção é limitada no tempo, um plano de saída deve estar em vigor e em conexão com os recursos locais de saúde mental para encaminhamentos); (ii) o licenciamento precisa ser reconsiderado (pois o serviço de apoio entre pares não é considerado tratamento e não há relação paciente-profissional); (iii) seguro contra negligência médica (recomendam que os profissionais obtenham uma consulta jurídica antes de iniciar o serviço); (iv) conflito de interesses (não houve interesses, nem políticos ou monetários, apenas desejo de ajudar colegas).

Categorizam o estado dos pacientes em 10 estágios. 1) perplexidade, fruto das incertezas do momento inicial; 2) choque, relativamente breve e com mudança de humor; 3) raiva, aumentada à medida que mais profissionais morriam e devido à falta de informação; 4) ansiedade, é o mais longo e continuou durante todo o projeto, incluindo uma série de preocupações, como as relacionadas à família; 5) estafa, marcada pelo contexto sobrecarregado de problemas; 6) desespero, devido à sensação de desesperança e desamparo; 7) aceitação, com elevação da esperança e percepção das muitas medidas rapidamente tomadas de assistência; 8) esperança, com a chegada de mais recursos e recuperações; 9) recuperação, devido ao início do retorno da vida ao “normal”; 10) “após”, com muitos retornando à linha de base, mas alguns com doenças mentais de longo prazo.

Concluindo destacam a unicidade da experiência pandêmica, com pessoas expostas a perdas e traumas contínuos, e o sucesso considerável da experiência. Apontam a abordagem inovadora da pesquisa, pois poucas fazem uso das mídias sociais para intervenção em crises. Embora não tenha havido coleta de dados formais, evidências apontam a utilidade desse tipo de intervenção, e com grande relevância, pois mantiveram, estavelmente, cerca de 300 membros ativos, ao longo do projeto. Por fim, expõem limitações do estudo, como o caráter ímpar da China (infraestrutura política, crenças culturais e fuso horário) e a necessidade de se considerar especificidades locais de cada país ao instituir grupos de apoio.

A principal contribuição do estudo foi demonstrar o uso eficaz das tecnologias cibernéticas e do apoio humano dos profissionais de saúde para ajudar trabalhadores a lidarem com a pandemia de COVID-19; e as principais limitações foram o não registro das atividades de apoio para obtenção de mais dados e a dificuldade de lidar com as especificidades da China, diferente culturalmente do Ocidente.